Especialista diz que setor agrícola do DF enfrenta o desafio de escassez de mão de obra
O engenheiro florestal e produtor de orgânicos Joe Valle alertou durante entrevista ao CB.Agro da última sexta-feira sobre um iminente "apagão" de mão de obra no setor agrícola do Distrito Federal. Segundo ele, a região já enfrenta uma carência de aproximadamente 10 mil postos de trabalho na área rural.
Valle destacou que o problema não está relacionado aos salários ou condições de trabalho, que segundo ele são "extremamente atrativos", incluindo carteira assinada, férias, décimo terceiro e todas as garantias trabalhistas. O especialista ressaltou que os empregadores têm se adequado às exigências trabalhistas e buscado oferecer melhores condições, como alojamentos adequados e ambientes confortáveis.
Joe Valle reforça seu compromisso em buscar soluções para a educação profissional, focando na formação de jovens para suprir a demanda de mão de obra no agronegócio do DF - Foto: CB.Agro / Reprodução |
O principal desafio, conforme explicou, está na atual geração de trabalhadores, que busca diferentes perspectivas profissionais. "A área rural, o trabalho é mais duro. Mesmo com todos os equipamentos que hoje a gente tem, porque a gente tem se adequado cada vez mais à questão trabalhista", explicou Valle.
Como solução, ele tem se dedicado à formação de jovens, com objetivo de capacitar 10 mil pessoas. O programa é voltado para filhos de agricultores familiares que moram ou moraram na área rural, visando resgatar essa mão de obra para o campo.
"Hoje todo mundo tem um curso superior feito a distância, então ele quer ir pra cidade porque acha que tem mais espaço lá e não quer ter o trabalho mais braçal", observou o especialista, destacando a necessidade de iniciativas que tornem o trabalho no campo mais atrativo para as novas gerações.
O real desafio é reverter precarização histórica
É irônico ouvir o empresariado reclamar da falta de mão de obra qualificada, quando são eles mesmos os responsáveis por essa escassez. A precarização das atividades técnicas, que exigem especialização teórica e prática, é uma prática nociva imposta pela elite econômica ao longo dos anos. Em busca de lucros maiores, esses empresários oferecem baixas remunerações e condições de trabalho inadequadas, desestimulando a formação técnica e afastando novos talentos.
Joe Valle, aponta para um "apagão" de mão de obra no setor agrícola do Distrito Federal. Ele afirma que os salários e condições de trabalho são atrativos, mas a realidade é que a precarização histórica desestimula a busca por qualificação profissional. Os egressos dos cursos técnicos têm uma visão muito diferente da descrita por Valle, onde a falta de valorização das atividades técnicas é evidente.
O Técnico Industrial Emerson Tormann destaca uma lacuna importante nas propostas apresentadas por Joe Valle durante a entrevista. "Em nenhum momento o engenheiro florestal e empresário lembrou ou se referiu aos Técnicos Agrícolas como uma alternativa para o 'apagão' de mão de obra", afirmou Tormann, criticando a omissão de uma categoria fundamental para o setor.
Analisando a fala de Valle sobre a carência de mão de obra no campo, alertando para o risco iminente de um colapso na agricultura do DF, Tormann observa que tal desprezo pelos técnicos agrícolas é alarmante: "Como pode o engenheiro florestal desconhecer uma classe de trabalhadores qualificados que compartilham atribuições com profissionais de sua formação?" - questiona.
O Conselheiro Tormann, resume bem a situação: "A elite econômica criou um ciclo vicioso de desvalorização das atividades técnicas, resultando na falta de profissionais habilitados e qualificados. A culpa é do próprio mercado, que historicamente violou direitos e deveres constitucionais para obter vantagem econômica."
Ou seja, a desvalorização sistemática das atividades técnicas é fruto da ganância da elite, que busca lucros fáceis às custas da precarização do conhecimento científico e tecnológico.
O estado como propulsor de irregularidades
Por outro lado, o poder público também é responsável por mais vilipêndio aos direitos trabalhistas ao ignorar as leis federais que regulamentam as profissões liberais. Além disso, mesmo quando cientes da legislação, continuam excluindo profissionais técnicos do rol de trabalhadores habilitados.
Essa prática desrespeita os direitos de uma classe inteira e constitui uma manobra criminosa para atender aos interesses de um pequeno grupo, impondo reserva de mercado que prejudica toda a sociedade. Em um caso recente, a justiça determinou que técnicos da CAESB devem estar registrados no CRT-01, evidenciando um flagrante de desrespeito do órgão às leis vigentes.
O Conselho Federal dos Técnicos Industriais - CFT tem dialogado com a Agência Nacional de Mineração - ANM no sentido de reverter o teor da Nota Técnica n.º4.717/2022. O documento emitido pela agência reguladora retira várias atribuições de técnicos industriais do setor da mineração.
E assim acontece diariamente em editais de licitação da administração pública, em normas de órgãos públicos como prefeituras municipais, bombeiros, concessionárias de água e energia elétrica, agências de governo e etc.
Enquanto o mercado, com o apoio do estado, continuar a priorizar lucros em detrimento da valorização profissional, a escassez de mão de obra qualificada persistirá. É necessário um esforço conjunto para reverter essa situação, começando pela valorização das atividades técnicas e a oferta de condições de trabalho dignas e remunerações justas. Somente assim será possível atrair novos talentos e garantir o desenvolvimento sustentável da indústria.
Nota de esclarecimento
Em resposta a este blog, o Engenheiro Joe Valle fez algumas considerações:
"Os técnicos agrícolas são parte fundamental da solução para o campo. O que observamos hoje é uma tendência dos jovens buscarem diretamente cursos superiores, muitas vezes deixando de lado a formação técnica que, no atual momento do setor produtivo, pode ser até mais relevante que a própria graduação. Nossa maior carência não é nem mesmo de profissionais técnicos - que também fazem falta - mas sim de trabalhadores para as operações básicas do campo. Os Institutos Federais têm cumprido um papel essencial na formação técnica, mas precisamos resolver o déficit de mão de obra nas atividades fundamentais do dia a dia na agricultura", completa.