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Tarifaço custa R$ 121 bi às famílias neste ano




Aumentos da gasolina (17,6%) e da energia elétrica (52,3) destroem o orçamento dos lares e levam uma legião de brasileiros para a lista de inadimplentes. Reajustes vão continuar em 2016 associados ao desemprego e à queda da renda


As famílias brasileiras estão cortando um dobrado para manter as contas em dia. Com a inflação nas alturas e o desemprego batendo à porta de muitos lares - 1,5 milhão de pessoas com carteira assinada foram demitidas nos últimos 12 meses -, um exército de brasileiros está engrossando a lista de inadimplentes. E nada está contribuindo mais para esse preocupante movimento de calote do que o aumento dos preços controlados pelo governo, mais precisamente, da gasolina e da energia elétrica, que, juntas, tiraram R$ 121,4 bilhões da renda dos trabalhadores somente neste ano. Um tarifaço e tanto.

Pelos cálculos do Banco Central, o aumento médio da gasolina em 2015 foi de 17,6%. Como o combustível movimentou quase R$ 135 bilhões no ano passado, com a venda de mais de 44,3 bilhões de litros, o reajuste total foi de R$ 23,8 bilhões. No caso da conta de luz, com aumento médio de 52,3%, R$ 97,6 bilhões a mais saíram do bolso dos brasileiros. Dados da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee) apontam que os consumidores gastaram R$ 186,7 bilhões no ano passado com energia.

O mais preocupante, destacam os especialistas, é que novos reajustes estão por vir, especialmente na eletricidade. Os aumentos contratados estão relacionados à decisão da presidente Dilma Rousseff de intervir, em 2012, nas tarifas de energia. A promessa da petista era de redução média de 20% na conta de luz. Para isso, baixou uma medida provisória, a 579, que acabou virando lei. O problema é que o país enfrentava, já naquele momento, escassez de chuvas. Os reservatórios caminhavam para os menores níveis da história.

Reeleição
Para garantir que as tarifas não subissem às vésperas da eleição presidencial e não pressionassem a inflação, Dilma obrigou o Tesouro Nacional a subsidiar os consumidores. Quando Joaquim Levy chegou ao Ministério da Fazenda, mudou completamente a política. Em vez de o governo arcar com os custos extras da energia, transferiu a conta para os consumidores. O mesmo foi feito com os combustíveis. A Petrobras, que já havia acumulado mais de R$ 60 bilhões em prejuízos com o represamento dos preços, passou a ter maior liberdade para aumentar os preços de seus produtos. Passou a vigorar o que o ex-ministro da Fazenda chamou de "realismo tarifário".

Não à toa, a venda de combustíveis registrou queda recorde de 7,1% em agosto, de 8,5% em setembro e de 11,4% em outubro em relação a iguais meses de 2014, mostra a Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Dos R$ 3 em média cobrados pelo litro da gasolina em dezembro do ano passado, o preço médio saltou para quase R$ 3,60 em novembro de 2015, conforme levantamento da Agência Nacional de Petróleo (ANP). No Distrito Federal, o consumidor é punido em R$ 0,20 a mais, com o litro vendido por praticamente R$ 3,80. Já a demanda residencial de energia elétrica acumula retração de 0,6% no acumulado do ano até outubro.

Faturamento
No entender dos economistas, a conta é simples: se os preços sobem e os rendimentos das famílias não acompanham, não há outra saída a não ser reduzir o consumo. O presidente da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de Lubrificantes (Fecombustíveis), Paulo Miranda Soares, é claro. "Em qualquer área do varejo, quando há oferta de produtos com preços mais baixos, a tendência é de se vender mais. Se os preços sobem, o faturamento diminui. Os recentes reajustes afastaram o consumidor dos postos de combustíveis", explica.

Soares destaca que, historicamente, as vendas de combustíveis estão atreladas ao movimento do Produto Interno Bruto (PIB). "Se a economia do país vai bem, as vendas vão bem. O mesmo acontece no caso contrário. Como, em 2015, a economia atravessa um período de crise, com queda no PIB, o consumo de combustíveis sente os efeitos da desaceleração", afirma. Para 2016, o dirigente da Fecombustíveis é mais pessimista. "As dificuldades para o setor serão ainda maiores no ano que vem. O consumo de combustíveis vai recuar pelo segundo ano seguido", estima.

Gerente de regulação da Safira Energia, Fabio Cúberos alerta, que, no caso da energia elétrica, o rombo estimado com base nas projeções de reajustes do Banco Central é otimista. "O cálculo do BC é apenas uma média. Muitas distribuidoras promoveram reajustes bem maiores do que 52%, resultado não só da crise hidrológica, como diz o governo, mas também do represamento provocado pela mudança do marco regulatório do setor de energia", explica.

Cláudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil, dá clareza ao reajuste de mais de 50% nas tarifas de energia. Segundo ele, 23% decorrem da Revisão Tarifária Extraordinária (RTE) concedida a todas as 63 distribuidoras do país em março; 17% são efeito da aplicação da bandeira vermelha o ano inteiro; e 12% se referem aos reajustes anuais das concessionárias.

Custo de empréstimos
Na avaliação de Cláudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil, os erros de gestão do governo têm parcela de 11% no tarifaço de energia. "Ao não fazer leilões e ou oferecer preços baixos, afastando comercializadores de energia dos pregões, o governo provocou a descontratação das concessionárias. Elas foram obrigadas a comprar eletricidade no mercado de curto prazo, o que resultou nos empréstimos bilionários que os consumidores vão pagar todos os meses na conta de luz por quatro anos", diz.

Cortes em despesas básicas


O forte reajuste das tarifas de energia elétrica e dos combustíveis obrigou as famílias a fazerem um doloroso ajuste no orçamento doméstico, com a redução de várias despesas, inclusive com itens básicos do carrinho de supermercado. "O que vimos em 2015 em termos de aumento das tarifas públicas foi uma violência", diz a aposentada Zuleika Mattos Paes, 73 anos. "Fui obrigada a cortar todo o meu gasto com lazer", acrescenta. Segundo ela, a conta mensal de luz saltou, entre 2014 e 2015, de uma média de R$ 90 para R$ 380 - incremento de 322%.

Zuleika ressalta que está se sentido enganada. "O governo prometeu, por meio de várias propagandas oficiais, que a conta de luz ficaria 20% mais barata. Eu acreditei. Agora, quando vejo a minha fatura, percebo que me enganaram", frisa. Ela ressalta que, mesmo controlando o consumo, mantendo as luzes de casa desligadas na maior parte do dia, o valor da conta não para de subir. "Fico pensando se realmente é preciso um reajuste tão elevado. Não há nada que justifique algo tão pesado de um ano para outro. Há algo de muito errado nisso", emenda

Para a comerciária Alessandra Marques, 34, está impossível fechar as contas do mês. "A luz ficou mais cara e a gasolina, também", afirma. "Estou me privando de muita coisa. Em um ano, a minha fatura de energia passou de R$ 120 por mês, na média, para R$ 250. O tanque do carro que eu enchia por quase R$ 100 agora custa R$ 150. Não há salário que acompanhe isso", reclama. No entender dela, os gastos a mais com eletricidade e combustível em apenas um mês são suficientes para bancar pelo menos dois meses da conta de água mais a prestação do seguro da moto do marido", assinala.

"O que vimos em 2015 em termos de aumento das tarifas públicas foi uma violência"
Zuleika Mattos Paes, aposentada

Pendências se acumulam


Apesar de concordarem que os reajustes da energia em 2016 não deverão ser tão altos como se viu neste ano, os consumidores devem se preparar, sobretudo porque a inflação continuará castigando a renda, e o desemprego tende a disparar. "Há muitas pendências a serem resolvidas no mercado de eletricidade", diz o professor Nivalde de Castro, coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Ele explica que o quadro do próximo ano é completamente diferente do registrado nos últimos três anos. "Tudo indica que vai chover acima da média histórica e poderemos desativar algumas termelétricas em 2016. Teoricamente, dentro desse contexto, não deveria ter aumento na conta de luz. Mas precisamos arrumar o que o tsunami deixou, ou seja, o que foi acumulado pelas intervenções do governo no setor", alerta.

Um aspecto que preocupa o professor são os leilões de geração termelétrica. "Quando os contratos foram feitos, o dólar estava a R$ 2,90. Agora a moeda norte-americana está próxima de R$ 4. Isso indica que os leilões precisarão ser revisados", diz Castro. O segmento das linhas de transmissão também é alvo de preocupação. "Esse é um problema muito sério. Em 2015, foram realizados leilões de sala vazia. Esses certames foram mandados para 2016, que ainda tem novos lotes", explica.

Governo ganha

Segundo Castro, os investimentos previstos nesses leilões são estimados em R$ 30 bilhões, mas não tem havido interessados, porque a cadeia produtiva está desestruturada. "Sem oferta de investidor, quebra o planejamento do sistema. Não adianta gerar se não tiver como transmitir a energia", alerta. Com a perda de grau de investimento do país por duas das principais agências de classificação de risco, a Standard & Poor´' (S&P) e a Fitch, o professor acredita que ficará ainda mais difícil atrair investidores estrangeiros.

Para o presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Nelson Leite, a situação será mais amena em 2016. "A Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) reduziu o preço da energia de Itaipu em 30% em dólar. Se tivermos um período chuvoso bom, a partir de abril, a bandeira deverá ser verde. Isso dá 8% de redução nas contas", estima. Leite lembra que alguns valores não recorrentes que passaram de 2014 para 2015, como restos a pagar de R$ 3 bilhões da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), não se repetirão em 2016.

A Abradee mostra, ainda, que quem mais ganhou com o tarifaço de energia foi o governo. Enquanto, em 2014, os tributos consumiram 33% do total gasto com energia, a média de 2015, depois da Revisão Tarifária Extraordinária (RTE) e da aplicação do sistema de bandeiras, saltou para 40%. (SK)

Fonte: Correio Braziliense
Emerson Tormann

Técnico Industrial em Elétrica e Eletrônica, especializado em Tecnologia da Informação e Comunicação. Atualmente, é Editor-Chefe na Atualidade Política Comunicação e Marketing Digital Ltda. Possui ampla experiência como jornalista e diagramador, com registro profissional DRT 10580/DF. https://etormann.tk | https://atualidadepolitica.com.br

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