O presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, não acredita que o desfecho de um processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, que alguns veem como forma de superar o impasse e a crise política, poderia reanimar os investimentos no país. "Creio que não. Não vejo uma relação direta. Na verdade, os problemas objetivos da economia brasileira continuarão os mesmos, clamando pelas mesmas soluções", afirmou Coutinho em entrevista ao Valor em Paris, onde participa da Conferência do Clima.
Ele projeta queda em torno de 25% no volume de desembolsos do BNDES este ano, mas o resultado depende de dezembro, que disse ser um mês forte. Até outubro, o total desembolsado ficou em R$ 146,8 bilhões. Por sua vez, o nível de consultas de interessados em financiamentos do banco declinou 46% entre janeiro-outubro. A taxa de investimentos no país em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) deve cair para cerca de 18,5% este ano, após ter chegado a 21,5%.
Para Coutinho, a contração dos investimentos do banco em 2015 claramente ajudou a reduzir o investimento na economia. "Se o BNDES tivesse comando maior sobre o investimento, como muita gente imagina, seria mais fácil recuperar a economia, utilizando a ferramenta crédito'', afirmou. Ele acrescentou que "o banco é importante, mas não pode fazer tudo sozinho, sem que haja uma reversão do estado de incerteza, especialmente em relação ao quadro fiscal, e sem que se crie condições para iniciar mais adiante a redução das taxas de juros".
Coutinho observou que o banco tem peso relevante especialmente na formação de capital fixo em áreas como máquinas e equipamentos, com um quarto do total, mas que uma parcela relevante da formação de capital - ligada a construção, serviços e muito do investimento de pequeno porte - tem menos relação com o banco.
Sobre a política adotada no primeiro mandato do governo Dilma, de gastar muito para capitalizar o banco, ele argumentou que os empréstimos do Tesouro foram convertidos em investimentos e ajudaram a sustentar a relação investimento/PIB mais alta, passando de 16,5% para algo em torno de 20,5% e recuando este ano de novo. "Ajudamos a entregar um investimento anual 3,5 pontos percentuais maior ao ano, e negar isso é querer tapar o sol com a peneira", disse.
Ele ponderou que o BNDES continua lucrativo, com ganho acumulado de R$ 6,3 bilhões até o terceiro trimestre. A inadimplência é nula, de 0,02%, mas as provisões aumentaram, alcançando cerca de 2% da carteira de crédito porque ocorreu queda em geral na qualidade do crédito, disse ele.
Coutinho negou que o setor de infraestrutura esteja demandando menos crédito. "Na verdade, é um dos poucos setores que vem crescendo", disse. Foram desembolsados R$ 40,8 bilhões até outubro para o setor e o total pode chegar a R$ 52 bilhões no ano. A demanda do setor de energia elétrica cresceu 11,6%, e outras áreas de concessões para rodovias e aeroportos, 7,8%. O plano do banco é de manter e aumentar esse volume de desembolsos em 2016. Isso vai depender do sucesso dos leilões em energia e em logística, que serão postos em marcha a partir do primeiro trimestre de 2016.
O presidente do BNDES apontou também o efeito "muito positivo" da desvalorização do real para o agronegócio e várias cadeias da indústria de processamento, de insumos e manufatureira. "Estamos trabalhando intensamente com vários segmentos da indústria para iniciar uma substituição de importação competitiva e partir para estratégia de exportações", disse. "Uma taxa de cambio acima de R$ 3,70 (por dólar) é suficientemente estimulante para tornar o Brasil uma plataforma relevante em muitas cadeias da indústria brasileira".
Coutinho reafirmou o comprometimento do banco nos financiamentos no setor de serviços, apesar da polêmica recente sobre esse segmento. "Exportação de serviços gera empregos de alta qualificação, é praticada em todas as economias mais importantes", disse. "Podemos aperfeiçoar mecanismos, mas não fazer (o financiamento) significaria entregar um mercado potencial que cria emprego e divisas para o país, e seria pouco inteligente abrir mão (disso)", completou.
Fonte: Valor Econômico