Assim, obtivemos mandato, perante os nossos associados, para insistir na busca de solução para o aumento da conta por meio do diálogo. Adiou-se a decisão - tomada pelas empresas em Assembleia Geral Extraordinária no fim de março - de combater a alta da CDE pela via judicial. Tal decisão teve por base as proporções elevadas que o encargo atingiu neste ano - ordem de R$ 3,2 bilhões apenas para o conjunto dos associados da Abrace, que representa indústrias da base das cadeias produtivas nacionais.
O problema é que, se, por um lado, a solidariedade recebida em Brasília não se traduziu em efeitos práticos no tempo necessário, por outro, o aumento do custo do encargo sim, com impactos devastadores nas indústrias. São quase R$ 880 mil por hora para as indústrias de todo o país, o equivalente, no acumulado do ano, ao custo de manutenção de cerca de 488 mil empregos. Parte significativa das empresas não tem condições de pagar os valores cobrados. Para se ter uma ideia, há casos em que o custo extra apenas do encargo chega a representar 200% do resultado operacional no ano passado. Em outros, equivale a toda a folha de pagamento. Diante desses efeitos, a contestação na Justiça tornou-se inevitável.
Recentemente, a imprensa chegou a indicar que, numa revisão dos valores da CDE, a indústria poderia ser favorecida em detrimento dos pequenos consumidores. Tal afirmação desconsidera, em primeiro lugar, o fato de que as mudanças dos últimos anos em torno do encargo, na realidade, acabaram criando subsídios cruzados dos grandes consumidores que recebem energia em alta-tensão e consumidores livres em favor dos regulados e de baixa tensão. Esses fatos somaram-se a outros em desfavor da indústria, como a não destinação de cotas das concessões de geração que venceram.
A mudança necessária no caso da CDE, portanto, é a correção de distorção do setor que o afastou ainda mais do realismo tarifário que vem sendo defendido. Além disso, a correção faz sentido do ponto de vista da economia como um todo, que é 15 vezes mais impactada quando o repasse de variações no custo da energia se dá sobre a produção. Afinal, a energia mais competitiva se traduz em aumento da geração de empregos, renda e crescimento econômico, com um efeito final da ordem de R$ 8,5 a mais no Produto Interno Bruto para cada R$ 1 a menos no seu custo.
Também ficou claro que não haveria outra solução que não a contestação judicial quando se verificou que a solução para a CDE que estaria em gestão teria efeitos apenas no futuro. A degradação das condições de competitividade da indústria nacional a impede de aguardar mais tempo, particularmente num momento em que a maioria dos seus competidores está em países nos quais é diretamente beneficiada pela queda de preços energéticos, mercados eficientes ou políticas de governo focadas na competitividade da produção.
Temos consciência de que a enorme transferência de custos para a indústria por meio da CDE não é fruto de decisões que propositadamente buscassem penalizá-la, mas sim efeito colateral de mudanças bem-intencionadas de regras que transferiram ao Tesouro Nacional custos de políticas públicas. Infelizmente, na impossibilidade de aportes dos custos prometidos, esses custos foram redistribuídos, penalizando desproporcionalmente a indústria.
O fato de tais decisões não serem intencionais, no entanto, não diminui a importância da reversão. Nas condições apresentadas à indústria neste momento, a CDE terá consequências desastrosas para a competitividade da produção nacional, num momento em que sua recuperação é imprescindível. Claro está, portanto, que a opção pela via judicial por parte da indústria é uma questão de sobrevivência e mesmo um apelo pela continuidade do diálogo.
Fonte: Correio Braziliense