Já se previa que 2015 seria um ano difícil. Os esperados ajustes fiscais e monetários levariam a uma queda na demanda e a um aumento nos custos de produção, combinação difícil para as empresas. O risco de fornecimento de água e energia elétrica e as incertezas sobre os rumos das investigações da Operação Lava-Jato completavam o quadro. Uma parte do ajuste já havia sido antecipada para 2014 - ano em que o PIB não cresceu -, mas a maior parte era mesmo esperada para este ano.
Estamos em maio, quase metade do ano ficou para trás. E, até agora, o cenário econômico tem se mostrado ainda mais difícil do que se antecipava. No início do ano, as projeções de mercado capturadas pela pesquisa Focus do Banco Central indicavam que o PIB este ano cresceria 0,55% e o IPCA alcançaria 6,5%. A mesma pesquisa hoje aponta uma queda de 1,2% no PIB, e a inflação superando 8%. Não devemos ter racionamento de oferta de energia, mas em grande parte porque o PIB fraco e a alta das tarifas vêm inibindo a demanda. As investigações da Lava-Jato se aprofundaram, com impactos sobre o mercado de crédito corporativo.
Quais as implicações desse cenário para as empresas? Quais as estratégias para navegar nesse momento turbulento?
O ambiente de incertezas, atividade em baixa e juros elevados afeta a liquidez da economia. Uma preocupação crescente entre os diversos setores ligados à produção de bens de consumo tem sido o aumento dos atrasos nos pagamentos e o incremento da inadimplência ao longo das cadeias produtivas, causando problemas de fluxo de caixa em muitos segmentos da economia. Como resposta, muitos setores têm aumentado o foco na gestão de caixa, aumentando o conservadorismo nas decisões de gastos.
Ligado ao problema de administração de caixa está o de gestão de custos. Apesar da recessão já estar abrindo uma considerável ociosidade em diversos setores da economia, os custos de produção no país ainda parecem estar subindo. Energia elétrica e gasolina (especialmente no Brasil, onde a matriz de transporte é majoritariamente rodoviária) são fatores de produção relevantes, e subiram de forma expressiva no início do ano. Os salários reais vêm subindo abaixo da inflação, mas o alívio não é grande, pois a inflação passada é elevada.
O mesmo acontece com outros custos, que estão moderando, mas a partir de um patamar muito elevado. Um exemplo: aluguéis. Os índices disponíveis (como o Fipe Zap) mostram recuo na margem, mas vindo de patamares muito elevados. Além disso, a apropriação da queda de custos não é imediata: é preciso rescindir o contrato anterior, o que normalmente gera uma multa, e arcar com custos de mudança para um endereço mais em conta.
Esta realidade vem impondo às empresas brasileiras a necessidade de ganhar eficiência e produtividade. O estreitamento de margens tem que ser compensado com ajustes "da porteira para dentro". Talvez a conjuntura econômica dos últimos 25 anos nunca tenha gerado incentivos tão claros nesta direção. Na década de 90, com a demanda interna deprimida, os ganhos de eficiência microeconômicos não faziam tanta diferença. Na década de 2000, o mercado interno se expandia tão rapidamente, que o foco estava mais na expansão da
produção e das receitas, do que na gestão de custos. Agora, a gestão de custos, mais do que uma boa prática, virou quase uma questão de sobrevivência para alguns segmentos.
A fase de ajustes econômicos abre também oportunidades para as empresas. Como as dificuldades são relativamente espalhadas entre os diversos setores da economia, uma empresa para se destacar não precisa necessariamente estar bem, mas sim estar melhor do que seus concorrentes. Desta forma, a crise atual representa uma oportunidade para as empresas mais bem posicionadas ganharem fatia de mercado, ou mesmo entrarem em regiões do país ou em negócios que ainda não operam, comprando empresas com a situação financeira mais fragilizada. Especialmente para empresas multinacionais e fundos de private equity, uma vez que a desvalorização cambial torna ativos brasileiros ainda mais atraentes. Esta realidade tem impulsionado o mercado de fusões e aquisições no País.
Outra oportunidade que emerge do ambiente de aperto de liquidez é o fortalecimento de parcerias ao longo das cadeias produtivas. Empresas com posição mais confortável de caixa vêm financiando fornecedores e clientes estratégicos, estreitando o relacionamento - algo que pode se provar valioso quando a economia entrarem recuperação.
As estratégias de "travessia" tendem a ser trabalhosas e os resultados (especialmente financeiros) não são imediatos. Mas valem a pena. Os fundamentos de longo prazo do Brasil - mercado interno grande e diversificado, setor agrícola forte, plano de concessões de infraestrutura ao setor privado - devem pavimentar o crescimento econômico, após a fase de ajustes. Do lado externo, o país tende a se beneficiar da recuperação econômica dos EUA, que deve impulsionar exportações da América Latina.
Devemos ficar atentos para fazer os ajustes que o momento atual exige e para as oportunidades que surgem para os negócios. Aquelas empresas e segmentos que melhor souberem navegar pela turbulência estarão mais bem posicionados para a retomada.
Fonte: Valor