O planejamento elétrico para um país de dimensões continentais como é o Brasil deve contemplar a presença de fontes de geração centralizada de grande porte, que são estratégicas para estruturação da operação na base do Sistema Interligado Nacional (SIN), devendo ser complementada por geração das fontes descentralizadas, que despacham a energia produzida diretamente na rede de distribuição, principalmente, nos centros de alta concentração de carga metropolitanos.
No entanto, o planejamento elétrico vigente não tem contemplado, com a amplitude e prioridade necessárias, ações para o aproveitamento das fontes regionais complementares (biomassa, solar, gás natural), cuja importância ganhou destaque no atual ciclo hidrológico desfavorável. Assim, no atual contexto energético, mais que uma questão de planejamento, torna-se oportuno estabelecer diretrizes e ações para ampliar a oferta de geração descentralizada, ou seja, a Geração Distribuída (GD), que possui condições de aliviar a demanda do SIN, com menor custo global para o sistema e para os consumidores.
A manutenção da diretriz atual de planejamento direciona para o aumento da participação das térmicas, o que é desejável, no atual contexto, mesmo que movidas por combustíveis fósseis, apesar dos custos elevados e aumento de emissão de gases de efeito estufa, afetando as políticas econômicas e de mudanças climáticas. Além disso, as diretrizes dos leilões de energia visam contratação da energia pelo menor preço, independentemente do investimento necessário para o transporte desta energia até os consumidores, da efetiva necessidade de oferta adicional de energia para atender a demanda da região onde se localizam os empreendimentos, e da diretriz de menor custo global para o SIN e para os consumidores.
É preciso ampliar a capacidade de geração junto aos centros de carga, com presença maior de fontes regionais
Como exemplo pode ser destacado o volume de energia eólica contratado nos últimos leilões, com grande concentração de projetos no Nordeste, superior à necessidade real de aumento da oferta para atender a demanda dessa região elétrica, e disponibilidade de rede para conexão, o que tem provocado custos adicionais para o sistema elétrico como um todo.O estudo realizado pela Empresa de Pesquisas Energéticas (EPE) em dezembro de 2014 para adequar a capacidade de transferência do excedente de energia contratada no Nordeste para o Sudeste aponta que "o crescimento acentuado do potencial de energia eólica, com significativa predominância na região Nordeste, torna necessário adequar o dimensionamento da rede básica a fim de escoar a energia das usinas já licitadas, bem como prover de folga o sistema elétrico de transmissão para conexão de novos empreendimentos". O potencial eólico adicional considerado no estudo, foi estimado em 8.750 MW de potência instalada, sendo necessário assegurar condições para o escoamento desses excedentes energéticos a médio e longo prazo.
O custo total dos investimentos previstos pela EPE nesse estudo foi estimado em R$ 6 bilhões, contemplando a instalação de 4.087 km de linhas em 500 kV, quatro subestações (total de 3 mil MVA), além de obras de menor porte em linhas de 345 kV e 230 kV, no Estado de Minas Gerais, com previsão de conclusão em 2019. Esses investimentos, que deverão ser licitados oportunamente, terão seus custos repassados aos consumidores na forma de tarifas de uso da transmissão (TUST).
No entanto, o que o atual contexto elétrico indica é a necessidade de redirecionar a política energética no curto prazo, visando prioritariamente ampliar a capacidade instalada de geração junto aos centros de carga, com maior presença das fontes regionais, reduzido investimento na logística de transmissão, contribuindo assim para o equacionamento do fluxo financeiro do setor elétrico.
Para superar necessidades de oferta de energia, a custos competitivos para o sistema elétrico, principalmente no curto e médio prazo, é recomendável que a EPE realize estudos de planejamento para o aproveitamento das fontes regionais, para as outras regiões elétricas, assim como foi feito para a região Nordeste, visando assegurar condições de suprimento complementar de energia elétrica, adotando como prioridade a geração descentralizada, que poderá suprir a demanda adicional com energia despachada diretamente nas redes de distribuição.
É recomendável portanto, que seja instituída uma agenda de política energética, que tenha como prioridade a realização de investimentos em Geração Distribuída (GD), a partir das fontes regionais do Sudeste e do Sul, que possuem menor prazo e complexidade de estruturação, de financiamento e de licenciamento ambiental.
É oportuno destacar que Geração Distribuída (GD) e a cogeração de energia - produção simultânea de energia elétrica e térmica, oferecem importantes benefícios técnicos e econômicos ao sistema elétrico, aos consumidores, ao meio ambiente e aos produtores. Com destaque a cogeração de energia pode ser impulsionada de imediato, principalmente nas instalações consumidoras das regiões metropolitanas, aproveitando a disponibilidade de gás natural na rede de distribuição, cujo mercado potencial está estimado em 3.500 MW para os setores terciário e industrial.
Carlos Alberto Silvestrin é graduado em engenharia industrial e de produção.
Fonte: Julio Bittencourt/Valor